MANIFESTO SOCIAL Nº 10/2020

ACÇÃO DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO INTENTADA POR JUÍZES, POR VEREM PUBLICITADAS AS SUAS AVALIAÇÕES.

Circulou, recentemente na internet, um documento, sobre uma ação declarativa de condenação, com processo ordinário, cujos autores são os Juízes de Direito, Hilário Garrido, José Carlos Barreiro, e Leonel Pinheiro.

Para a melhor compreensão do assunto em causa, o Observatório Transparência STP passa a citar o conteúdo do documento:

"Em novembro de 2015, numa reunião com assessores portugueses contratados para assessorarem o inspetor judicial, os Juízes foram informados de que se iria proceder a uma inspeção judicial, com carácter pedagógico e posteriormente seriam ministradas sessões de formação."

“Em março de 2016, os juízes receberam um relatório de inspeção judicial, elaborado pelo assessor português, que tinham sido classificados de Medíocre.”

Para os Juízes Hilário Garrido, José Carlos Barreiro, e Leonel Pinheiro, "com o objetivo de os humilhar, o Conselho Superior de Magistrados Judiciais e o Chefe do Governo, tornaram público na vitrina do tribunal e na Televisão Santomense o relatório da inspeção."

Para os Juízes, “esse comportamento intencional e culposo do Conselho Superior de Magistrados Judiciais e do Primeiro Ministro e Chefe do Governo, atingiram de forma maldosa a dignidade, a honra e o bom nome de cada um deles, deixando-os ferido de morte e confinados ao sofrimento, angústia e vergonha junto de familiares e amigos."

Por tudo isso, os juízes Hilário Garrido, José Carlos Barreiro, e Leonel Pinheiro pediram ao estado santomense, a título indemnizatório, a quantia de STDN 3.675.000,00 (Três Milhões, Seiscentos e setenta e Cinco Mil dobras), equivalente a 150.000,00 Euros para cada um.

O Observatório Transparência STP procedeu à análise do assunto, formulando e respondendo às seguintes questões:

1- OS JUÍZES PODEM SER AVALIADOS?

De acordo com o Estatuto dos Magistrados Judiciais, no nº 1 e 2 do Artigo 35.º com epigrafe, "Periodicidade das classificações":
1. Os magistrados são classificados em inspeção ordinária com uma periodicidade de 3 anos.
2. Pode ser ainda efetuada a inspeção extraordinária a requerimento fundamentado dos interessados, ou em qualquer altura, por iniciativa do Conselho Superior de Magistrados Judiciais.
Ainda, segundo o Artigo 154.º do mesmo Estatuto, a inspeção tem por finalidade:
a) Facultar ao Conselho Superior de Magistrados Judiciais elementos pormenorizados sobre o estado dos serviços;
b) Classificar os magistrados e eventual procedimento disciplinar;
c) Dar indicações genéricas que permitam ultrapassar as dificuldades dos inspecionados, sem interferência direta nos serviços.
De salientar que segundo o Artigo 36.º, com epigrafe, "Critérios e efeitos das classificações":
1. A classificação dos magistrados judiciais deve atender ao modo como desempenham a função, ao volume de trabalho, ao serviço desenvolvido, às condições de trabalho prestado, à preparação técnica, à categoria intelectual e à idoneidade cívica dos mesmos.
2. A inspeção dos magistrados judiciais incide sobre as suas capacidades humanas para o exercício da profissão, a sua adaptação ao serviço a inspecionar e a sua preparação técnica.

2- OS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO PODEM SER TORNADOS PÚBLICO?

Sendo os juízes, os únicos titulares de Órgãos de Soberania não escrutinados nas urnas, a avaliação de desempenho é de interesse público, e assim sendo, é a única forma de serem escrutinados e daí obviamente, toda a necessidade dessa avaliação ser tornada público.

3- UM JUIZ COM UMA AVALIAÇÃO MEDÍOCRE PODE CONTINUAR NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO?

Conforme o artigo 34.º, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, com epigrafe, "Classificação dos juízes de direito".
Os Juízes de Direito são classificados, de acordo com o seu mérito de: Muito Bom, Bom com Distinção, Bom, Suficiente e Medíocre.
Sendo que: A classificação de medíocre implica a suspensão do exercício de funções e a instauração de inquérito por inaptidão para exercício de magistratura, segundo o nº 8 do Artigo 36.º, "Critérios e efeitos das classificações."

4- O QUE ACONTECE A UM JUIZ CLASSIFICADO DE MEDÍOCRE?

Por não ter aptidão para o exercício do cargo, o Conselho Superior da Magistratura suspende-o e manda instaurar um processo disciplinar, com vista ao seu despedimento. Segundo o Artigo 106.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais com epigrafe, "Penas de aposentação compulsiva e de demissão".
1. As penas de aposentação compulsiva e de demissão são aplicáveis quando o magistrado:
a) Revele definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função;
b) Revele falta de honestidade, grave insubordinação ou tenha conduta imoral ou desonrosa;
c) Revele inaptidão profissional;

5- O PROCESSO DISCIPLINAR É PÚBLICO?

De acordo com o nº 1 do Artigo 117.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais com epigrafe, "Natureza confidencial do processo".
O processo disciplinar é de natureza confidencial até a decisão final, devendo ficar arquivado no Conselho Superior de Magistrados Judiciais.
Quer isso dizer que, em tese, o processo disciplinar é secreto até a fase de condenação, sendo certo que a suspensão consubstancia uma pena.
O processo disciplinar que conduz ao despedimento dos juízes tem como único fundamento, a classificação de Medíocre, isto é, não contém qualquer matéria que possa pôr em causa, a honra, a dignidade e o bom nome de quem quer que seja porque é uma matéria decorrente da própria lei.
Publicitação das deliberações do CSM, da classificação e do eventual processo disciplinar por inaptidão para o exercício da função de juiz não pode ser considerado um ato ilícito.

Portanto, o fundamento do pedido de uma ação declarativa de condenação contra o Estado, só pode ser fundada no ato ilícito praticado por agente do Estado.

6- O FACTO DO PRIMEIRO MINISTRO DE ENTÃO FAZER REFERÊNCIA DA PUBLICITAÇÃO DOS CLASSIFICADOS DE MEDÍOCRE É UM ATO ILÍCITO?

Só poderá ser considerado de ato ilícito por uma decisão judicial após prévio processo de difamação, calúnia ou injúria, processo esse que não teve lugar.

7- FOI LEGAL A INTEGRAÇÃO DOS MAGISTRADOS CLASSIFICADOS DE MEDÍOCRE?

As deliberações do CSM cabem recurso à plenária do Supremo Tribunal Administrativo. Segundo o Artigo 148.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais com epígrafe, "Funcionamento e periodicidade das reuniões".
1. O Conselho Superior de Magistrados Judiciais funciona em plenário.
2. O plenário é constituído por todos os membros do Conselho.
4. As deliberações são tomadas à pluralidade de votos, cabendo ao Presidente, o voto de qualidade.
5. Para validade das deliberações exige-se a presença de um mínimo de três membros e estando em causa a apreciação do mérito e o exercício da função disciplinar relativos a funcionários de justiça um mínimo de quatro, sendo um deles, obrigatoriamente o membro eleito pelos funcionários.

No caso em apreço, a reintegração dos referidos juízes foi feita por um único Juiz Conselheiro, Frederico da Glória, em clara violação da lei, pelo que a mesma é nula e de nenhum efeito.

8- OS JUÍZES EM CAUSA PODEM, NESSAS CIRCUNSTÂNCIAS, PEDIR A CONDENAÇÃO DO ESTADO EM CERCA DE MEIO MILHÃO DE EUROS?

A própria petição intentada pelos Juízes carece de fundamentação jurídica. Acresce-se a tudo isto que um dos referidos Juízes já fora jubilado, e se encontra exercendo funções de Juiz Conselheiro do Tribunal Constitucional.

O país continua a conviver com essas irregularidades AGUARDANDO A PROPALADA REFORMA DA JUSTIÇA!

Por tudo isso, o Observatório Transparência STP exorta os órgãos de soberania ao respeito e ao cumprimento das leis da República Democrática de São Tomé e Príncipe.
Recomenda à Assembleia Nacional e ao Governo, a necessidade de continuar a auditar os tribunais por ser um serviço público que deve compaginar com os objetivos legais e constitucionais.
Verificar a qualidade dos serviços prestados, os seus custos, a dimensão e excelência dos seus profissionais e o cumprimento das regras deontológicas. Por serem matérias que prendem com a soberania e, assim sendo, devem ser fiscalizadas por todos os demais órgãos de soberania e, se necessário, por entidades externas independentes.

Por último, recomendar o Ministério Público enquanto titular de ação penal, que tudo deve fazer, em defesa do erário publico e dos contribuintes.

O Observatório Transparência STP reitera que o seu papel enquanto iniciativa da sociedade civil, é o de questionar, alertar e contribuir para a defesa da legalidade, dos direitos fundamentais dos cidadãos, da transparência e melhor comunicação por parte dos decisores públicos, cabendo a estes, no âmbito das suas responsabilidades e funções, tomar as decisões com vista a salvaguardar o interesse público, no estrito cumprimento das leis em vigor e das regras da democracia que fundamentam o nosso estado.

São Tomé 5 de novembro de 2020.

Observatório Transparência STP
+ transparência > efectividade

ObservatórioSTP

2020-11-09

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